O Futebol é considerado o desporto organizado mais popular do mundo.
Este desporto colectivo e de contacto, envolve um sem número de informações no que conerne às movimentações de companheiros e adversários, trajectórias da bola, decisões do árbitro e manifestações dos espectadores.
Por outro lado, existe uma exigência competitiva crescente, a que não é alheia a calendarização densa de jogos e a procura de um rendimento elevado, que potenciam os mecanismos agressivos que lhe estão adjacentes. Neste âmbito, não pode deixar de ser mencionado, a permissão da falta interncional e as marcações individuais cada vez mais aperfeiçoadas, onde os contactos físicos são frequentes. Estes aspectos conjugados como as condições do terreno de jogo (alguns com bastantes irregularidades), as condições ambientais,o uso de pitões no calçado desportivo e os movimentos característicos (que irão ser referidos a seguir) criam condições para um tipo de lesão traumática característica deste desporto.
Na verdade, este desporto é um jogo com cinética heterogénea, onde ocorrem mudanças de velocidade e direcção de grande amplitude, com comportamentos técnico-tácticos específicos, ora em situações de oposição ora de cooperação.
Horta e Aires (1995), referem que a génese e o devido funcionamento dos programas estão dependentes de:
• Integridade anatomo-funcional a nível osteo-articular, nervoso e muscular
• Organização de circuitos de integração a diversos níveis do SNC entre as aferências periféricas ( proprioceptivas, visuais, exteroceptivas) e centrais (psicoemocionais), com as vias aferentes motoras, assim como a estruturação de padrões de actividade multimuscular automatizados( Engramas), cuja génese se obtém pela repetição de movimentos
Assim, o aumento da complexidade de uma tarefa, será acompanhada pela necessidade de repetição, para obter a melhoria da execução, o que pode originar a fragilização da integridade das estruturas anatómicas.
Segundo, Horta e Aires (1995), o pé, a tibio-társica,o joelho, a cintura pélvica e a coluna, principalmente na região lombo-sagrada e dorso-lombar são os segmentos anatómicos mais solicitados, através dos seguintes gestos, que são típicos do futebol:
• Remate, onde é manifesta a coordenação entre o trem superior e inferior, pela acção coordenada entre agonistas e antagonistas, com elevadas tensões suportadas pela região púbica.
• Os cabeceamentos com prévia impulsão, exigindo rotações a nível da coluna lombar e cervical, com hipersolicitação das charneiras e das articulações vertebrais posteriores.
• A recepção ao no solo, após elevação, com elevadas tensões suportadas pelo pé e tibio-társica, ou o joelho, no caso de a tibio-társica se encontrar bloqueada no solo, com rotações simultâneas do tronco.
• Os tackles, muitas vezes observados para fazer oposição a um adversário
Soares (2007), baseando-se em dados de Wong e Hong (2005), também aborda estes aspectos, referindo o “tackle”, a corrida, sofrer desarme, remate, mudança de direcção e sentido e reepção no solo após salto como os mecanismos de lesão mais comuns. Quanto às regiões anatómicas mais afectadas refere o joelho, o tornozelo e a anca.
Assim, no sentido de se compreender crescentemente a entorse tibio-társica, será feita uma análise anatómica e funcional das estruturas da articulação, seguidamente.
Anatomia funcional
A articulação da tibiotársica é formada por três ossos: a tíbia, o perónio e o astrágalo.
(figura 1)
A tíbia é o principal osso de suporte da perna, sendo que a sua porção distal se articula com o astrágalo, formando uma articulação em sela, segundo Crowther (2004). Um complexo ligamentar e de uma membrana interóssea juntam a tíbia ao perónio, o que a nível da tíbia e perónio distais, a articulação destes dois ossos por estas estruturas, forma a articulação tibio-peronial inferior. (figura 2)
Segundo Crowther (2004), o perónio suporta 20% do peso, contrariamente ao pensado antigamente, que o osso apenas servia para ligação muscular. A sua porção distal, maléolo externo, articula com a faceta externa do astrágalo, e a proeminência interna distal da tíbia, maleólo interno, articula-se com a porção interna do astrágalo, sendo este formato de encaixe da tibiotársica que permite grande parte da sua estabilidade quando suporta peso.
Quando se fala em articulações, pode-se referir a tibiotársica como forte, segundo Crowther (2004), cuja estabilidade é afectada pelos ligamentos, estruturas musculo-tendinosas e até pela posição articular durante a carga em stress. É de referir, que as forças para baixo motivadas pelo suporte de peso, ajudam ao aumento da estabilidade articular.
Dado o astrágalo ser mais largo na região anterior, quando este se encaixa no conjunto tibioperonial aquando da flexão dorsal do tornozelo, os movimentos laterais desta articulação tornam-se praticamento nulos. Pelo contrário, aquando da flexão plantar, como a região do astrágalo que encaixa no conjunto tibioperonial é a posterior(mais estreita), existe uma maior mobilidade do tornozelo e por consequência uma maior instabilidade articular. Assim, o maior número de entorses do tornozelo, acontece quando o mesmo adopta a inversão (flexão plantar, adução e supinação do tornozelo) .
2.1.1 Ligamentos
Do tornozelo fazem parte duas importantes estruturas ligamentares. A interna, que constitui o ligamento lateral interno ou deltóide (figura 3), formada por 2 feixes, superficial e profundo, este mais importante do ponto de vista funcional. Muito poucas vezes, há ruptura isolada do feixe profundo, sendo associada muitas vezes com fractura do maléolo peronial ao nível da sindesmose tibioperonial ou inclusivamente mais proximal.
Segundo Ryan e Starkey (1999), o ligamento deltóide é constituído por 4 ligamentos: tibiotalar anterior (com origem na parte antero-medial do maléolo tibial e inserido na parte superior do talo medial), tibiotalar posterior (que abrange o aspecto posterior do maléolo medial, inserindo-se na parte posterior do astrágalo, tibiocalcâneo (com origem no ápice do maléolo medial e com inserção no calcâneo, abaixo do maléolo) e tibionavicular ( que avança por baixo e numa direcção ligeiramente posterior ao ligamento tibiotalar anterior,sobre a superfície medial do navicular).
Figura 3- ligamento deltóide
Fonte. Ryan, J.; Starkey, C.(1999). Evaluation of Orthopedic and Atlhetic Injuries. Davis company. Pág.89
Quanto à estrutura ligamentar externa (figura 4), o ligamento lateral externo é constituído por três feixes: o ligamento perónio-astragalino anterior ou feixe anterior que parte da região anterior e distal do perónio para o corpo do astrágalo, o ligamento perónio-calcaneano ou feixe médio situado profundamente à bainha dos peroniais, e o ligamento perónio-astragalino posterior ou feixe posterior, da região posterior da extremidade distal do perónio para a região posterior do astrágalo.
Figura 4- ligamento lateral externo do tornozelo
a) feixe perónio-astragalino anterior
b) feixe perónio-calcâneo
c) feixe perónio-astragalino posterior
Fonte: Massada, J.(2003). Lesões no Desporto. Editorial Caminho. Lisboa pág.155
Massada (2003) aborda os movimentos da articulação do tornozelo assim como o estado dos respectivos ligamentos:
• Na flexão plantar da articulação o ligamento perónio-astragalino anterior está tenso, contrariamente ao feixe posterior, o que por si só, justifica o número de lesões do feixe anterior durante a inversão do tornozelo.
• Na flexão dorsal verifica-se o inverso. O feixe posterior encontra-se relaxado ao invés do feixe anterior, pelo que também aqui está evidenciada a justificação para o pequeno número de lesões completas do feixe perónio astragalino posterior.
• Na posição neutra, os feixes perónio astragalinos estão relaxados ao invés do perónio-calcaneano que se encontra tenso.
• Outra justificação para para o maior número de lesões do feixe perónio astragalino anterior, quando em comparação com o feixe posterior, é a resistência mecânica à tensão: 138 Newton do primeiro contra 345 Newton do segundo.
No entanto, não devemos falar sobre a articulação do tornozelo, se não abordarmos também o calcâneo, o navicular, o cubóide e o quinto metatarsiano pelo facto de importantes inserções musculares e ligamentares ocorrerem nestas referidas estruturas.
2.1.2 Calcâneo
O calcâneo tem um papel importante no funcionamento da articulação em causa, pelo facto de estar inserido nesta estrutura o tendão de aquiles, que funcionando como um grande braço de alavanca acrescenta mais força durante a deambulação. É também nesta estrutura que se inserem alguns dos ligamentos do tornozelo, tanto interna como externamente, como já foi referido. Devido ao facto, do tendão de Aquiles estar associado aos dois principais flexores plantares (gastrocnémio e solear) (anexoI), qualquer lesão deste tendão origina um défice de plantarflexão, podendo ser comprometida a marcha do atleta, bem como o andar, a corrida e o salto. O que poderá, no caso de utilização do atleta, um risco acrescido de entorse. (anexo II)
2.1.3 Navicular
Quanto ao navicular, que se situa anteriormente ao astrágalo, ao longo do arco medial do pé, serve como local de inserção para os músculos tibiais, quer anterior como posterior, e pelo ligamento calcaneonavicular plantar oferece sustentação ao arco longitudinal medial. (anexoIII)
2.1.4 Cubóide
O cubóide, encontra-se situado lateralmente ao longo do arco longitudinal lateral está situado anteriormente ao calcâneo, e o quinto metatarsiano articula-se distalmente com a região ântero-lateral do cubóide. Ambos, têm como principal função servir como estruturas de inserção do curto peronial, assim como permitem uma via de passagem do peronial longo, ao longo do região plantar do pé. (anexo IV)
2.2 O que é uma entorse
A entorse do tornozelo é muito frequente em atletas, concretamente no futebol, pelos movimentos típicos referidos anteriormente.
Massada(2003), refere que a entorse do tornozelo, representa, sem margem para dúvidas a patologia traumática do sistema esquelético que mais vezes atinge o Homem, quer desportista, quer sedentário, apresentando na tabela que se segue a frequência das diferentes lesões traumáticas no futebol, em que a entorse tibiotársica aparece em primeiro plano:Fonte: Fonte: Massada, J.(2003). Lesões no Desporto. Editorial Caminho. Lisboa pág.171
Massada (2003) define entorse como: lesão articular desencadeada por um vector mecânico agudo, mantendo-se normal a congruência entre as superfícies articulares.
Quanto a Nunes (1998), refere serem: lesões produzidas ao nível de uma articulação, (...) em que a articulação do tornozelo é forçada, não havendo separação das superfícies articulares.
Soares (2007), baseando-se num estudo de Ekstrand para a UEFA quatro anos antes, refere que as lesões do tornozelo, em particular as entorses, têm uma frequência de 2/1000h e originam a ausência de 18 dias de ausência de treinos e competições em média. No entanto, este mesmo estudo, mostra o aumento significativo de entorses do tornozelo em atletas amadores, bem como o tempo de inactividade, cerca de 4 semanas.
A maioria das entorses desta trocleartrose, são por inversão, resultando em traumatismos sobre os ligamentos laterais. No entanto, apesar da menor frequência, existe um significativo número de entorses envolvendo os ligamentos mediais e a sindesmose. Devido ao facto de muitos dos ligamentos estarem associados à cápsula, a lesão desta estrutura está frequentemente associada à lesão ligamentar. Outras complicações que podem suceder são as fracturas do encaixe do tornozelo, avulsão dos ligamentos ou luxação do astrágalo.
2.2.1 Entorse por inversão
A lesão dos ligamentos laterais tende a suceder quando o pé está em em flexão plantar, quando o pé se encontra na posição de máxima incongruência. Muitos dos movimentos que referimos anteriormente, originam o posicionamento do pé em flexão plantar, como a recepção ao solo após salto, mudança de direcção ou oscilação na marcha.
Segundo Ryan e Starkey (1999),a lesão do ligamento calcaneofibular sucede secundariamente ao traumatismo do ligamento astrágaloperonial anterior, sendo que quando o pé inverte, em posição neutra é o calcaneofibular o principal restritor contra inversão, pelo que a lesão poderá restringir-se a essa estrutura. Com excepção da lesão isolada deste ligamento, pode observar-se rapidamente um edema circundante ao maléolo lateral, por laceração no(s) ligamento(s) e possivelmente na cápsula. Deve ser dada a devida atenção à dor e crepitação, sobre a origem e inserção do ligamento, que poderá ser indício de uma possível fractura por avulsão.
No entanto, o facto do mecanismo ser de inversão, não deve circunscrever a suspeita de lesão aos ligamentos laterais, porque também pode originar uma lesão da cápsula medial e das estruturas que passam distal e posteriormente , principalmente o tibial posterior.
Ainda segundo Ryan e Starkey (1999), a excessiva inversão do astrágalo e calcâneo pode causar uma fractura do maléolo medial distal ou da base do quinto metatarsiano. Há ainda a acrescentar a possibilidade de lesão do nervo fibular por tracção.
Deve existir um cuidado suplementar na avaliação de atletas adolescentes, devendo a exibição de uma excessiva frouxidão originar a realização de exames complementares de diagnóstico para despiste da existência de fracturas epifisárias.
É de referir que atletas com antecedentes de entorse do tornozelo por inversão, estão mais propensos a lesões subsequentes e sintomas residuais. Na verdade, este tipo de entorse crónica ou com cariz de gravidade origina vários distúrbios secundários. Seguidamente a uma laceração dos ligamentos astrágaloperonial anterior e calcaneoperonial, a cápsula ântero-lateral pode formar uma densa zona de tecido conjuntivo que acaba por originar um impingindo-se entre o maléolo lateral e o calcâneo, quando o pé/tornozelo estão em dorsiflexão e eversão. Outro fenómeno que pode estar associado a uma entorse por inversão é lesão condral astragalina, que não são detectadas com facilidade na rx de rotina, pelo que a ressonância magnética e a cintilografia óssea aumentou a frequência de diagnóstica da lesão. Lesão essa que se apresenta como dor de origem não identificável e de sensibilidade ao longo da parte ântero-medial superior tibial do encaixe do tornozelo.
2.2.2 Entorses por eversão
A resistência do ligamento deltóide, bem como a superioridade mecânica do maléolo lateral, limita a eversão justificando assim o facto de apenas 15% das entorses desta articulação originarem a lesão do referido ligamento, segundo Ryan e Starkey(1999).
Devido à pequena quantidade de eversão normalmente associada à articulação subastragalina, 5% segundo Ryan e Starkey(1999), o mecanismo primordial para lesão destes ligamentos é a rotação externa do astrágalo em relação ao encaixe do tornozelo.A dor está está presente ao longo da articulação medial, sendo que o edema tem tendência para ser mais localizado que nas entorses por inversão. Cailliet (1993), apresenta uma sucessão de imagens representativas de uma possível entorse do tornozelo por eversão.(figura 5)
Figura 5
Segundo o autor, A e C representam o pé com bom alinhamento ósseo e articular, calcanhar central e bom arco longitudinal. Quanto a B e D representam o stress que desalinha as estruturas. As figuras pretendem mostrar o impacto de sustentação da tíbia(1) sobre o astrágalo(2), existindo tendência para este deslizar anterior e medialmente, sobre o calcâneo. Sob pressão, o calcâneo everte e migra posteriormente (3), existindo alongamento do arco longitudinal e pressão sobre a fáscia plantar (4). A rotação do calcâneo deprime o osso navicular (5), traccionando o ligamento calcaneonavicular(7). O valgo inicial do calcanhar força o ligamento colateral medial(6) e, finalmente, o ligamento calcaneoastragalino(8).
Fonte: Cailliet,R.(1993). Mechanisms and management. Davis Company. California pág. 231
Quando o mecanismo de eversão acontecer, deve-se avaliar criteriosamente o maléolo lateral para despiste de uma possível fractura por compressão. (figura 5)
Figura 6 - fractura do maléolo lateral causado por excessiva eversão
Fonte: Ryan, J., Starkey,C(1999). Evaluation of Orthopedic and Athletic Injuries. Philadelphia.pág115
2.3 Classificação das entorses
Após a pesquisa, foi possível observar que a maioria dos autores classifica as entorses pelo grau de integridade dos ligamentos, apresentando 3 diferentes graus, sendo tanto maior o grau quanto maior for o comprometimento da integridade dos ligamentos.
Assim, Crowther (2004) e Pinheiro(2006) seguem a classificação que se referiu anteriormente.
Crowther afirma que na entorse de grau I existe um estiramento do ligamento, sem ruptura macroscópica do mesmo. Embora possa estar dolorosa, a articulação possui estabilidade, o indivíduo tem uma função articular normal. (figura 7)Figura 7- entorse Grau I
Fonte: Crowther, C. (2004). Primary Orthopedic Care. Mosby. Nova Iorque. Pág. 283
A lesão que origina alguma ruptura macroscópica do ligamento, com edema moderado e dor, bem como alguma limitação funcional, é para o autor, uma ruptura de grau II (figura 8). Figura 8- entorse Grau II
Fonte: Crowther, C. (2004). Primary Orthopedic Care. Mosby. Nova Iorque. Pág. 283
Quanto ao III grau, significa a ruptura total do(s) ligamento(s) com edema marcado, equimose e instabilidade articular. (figura 9). Figura 9- entorse Grau III
Fonte: Crowther, C. (2004). Primary Orthopedic Care. Mosby. Nova Iorque. Pág. 283
Pinheiro (2006), como referido anteriormente classifica nos mesmos 3 graus, acrescentando, contudo, uma abordagem à integridade capsular e ao tecido conjuntivo.
Assim, o grau mais baixo traduz uma lesão benigna, em que há um estiramento ligamentar e/ou capsular, sem interrupção de continuidade tissular. Não existe alteração do tecido conjuntivo ou da rede vascular. Segundo o autor, há um envolvimento ligamentar isolado, com um processo inflamatório bem localizado, sendo as alterações no desempenho pouco significativas, com incapacidade desportiva de curta duração.
Quanto ao grau intermédio, representa uma perda da integridade tissular, envolvendo a cápsula e o complexo ligamentar. Estas alterações estruturais dos elementos conjuntivos, originam um processo inflamatório valorizável, com hemorragia e eventual equimose no local ou à distância. As alterações funcionais estão presentes, observando-se incapacidade nas actividades de vida diária, e, especificamente, impossibilidade de desempenho físico, que dura algumas semanas.
conjuntivas é extensa, com hemorragia, equimose, edema tissular e aumento da pressão compartimental. A incapacidade no desempenho das actividades de vida diárias bem como no desempenho desportivo, é marcada. Este processo decorre ao longo de várias semanas, estando associado o risco grave de instabilidade articular. Segundo o autor, podem coexistir lesões osteocondrais, ósseas ou musculo-tendinosas, pelo que o prognóstico é reservado. A opção terapêutica conservadora ou cirúrgica depende das características específicas da lesão, bem como do perfil do lesionado, sendo que na primeira opção, os tempos de imobilidade são habitualmente prolongados.
Quanto ao terceiro grau, que representa uma lesão grave, determina uma agressão valorizável das estruturas capsulares e ligamentares. A agressão às estruturas vasculares e
2.4 Testes para estabilidade ligamentar
Os vários testes de movimentos, também permitem o stress sobre os ligamentos do tornozelo, fundamentalmente na execução de movimentos passivos. Nestes testes, deve ser tido em linha de contaa folga nos movimentos articulares, a dor localizada e a instabilidade articular.
2.4.1 Teste da gaveta anterior
Este teste realiza-se, segundo Ryan e Starkey (...), com o atleta sentado na borda da mesa, com o joelho dobrado, para evitar o enrijecimento do gastrocnémio, que influenciaria o resultado. O examinador deve estar de frente para o atleta, com uma mão a estabilizar a parte inferior da perna, e a outra a envolver o calcâneo, enquanto o antebraço sustenta o pé em ligeira plantarflexão. Na execução do teste, o examinador tracciona o calcâneo e o astrágalo para a frente, aplicando simultâneamente uma força estabilizadora à tíbia. (figura 10) Figura 10- Realização do teste da gaveta anterior
Fonte: Ryan, J., Starkey,C(1999). Evaluation of Orthopedic and Athletic Injuries. Philadelphia.pág108
O resultado é positivo se o astrágalo desliza anteriormente, desde a parte inferior do encaixe do tornozelo, quando comparado com o membro contralateral (figura 11). Pode-se ouvir um estalido considerável ou o atleta refere dor. Este resultado positivo, implica a laceração do ligamento perónioastragalino anterior e da cápsula associada. Figura 10- Resultado positivo do teste da gaveta anterior
Fonte: Ryan, J., Starkey,C.(1999). Evaluation of Orthopedic and Athletic Injuries. Philadelphia.pág108
2.4.2 Teste de stress por eversão
Neste teste, o examinador de frente para o atleta, com uma mão estabiliza a parte inferior da perna e com a outra provoca um stress por eversão,segurando o calcâneo, para determinar a integridade do ligamento deltóide. O resultado é positivo se o astrágalo se inclina ou abre excessivamente, quando comparado com o membro contralateral, ou se o atleta refere dor durante esse movimento
2.4.3 Teste de stress por inversão
Apesar de este teste, também provocar stress sobre os ligamentos astrágaloperoniais anterior e posterior, é mais específico para o ligamento peróniocalcaneano. O examinador estabiliza a parte inferior da perna com uma mão, e com a outra agarra o calcâneo mantendo o pé numa posição neutra. Esta mão que segura o calcâneo promove um stress por inversão, rolando internamente o calcâneo e causando a inclinação do astrágalo. O teste é positivo se o astrágalo abre excessivamente, em comparação com o membro contralateral, o que implica o envolvimento do ligamento peróniocalcaneano e, possivelmente, dos ligamentos astrágaloperoniais anterior e posterior.
2.5 Tratamento
Massada (2003), aborda o tratamento referindo-se à classificação por si adoptada, em 2 graus: estável ou instável. Assim, no que diz respeito à primeira o autor aconselha a aplicação imediata de gelo nas primeiras 48 horas, duas a três vezes por dia, por períodos de 20 minutos. Esta aplicação, deve ser feita por cima de uma ligadura elástica justa, que será mantida durante 4 a 7 dias. Desde que a dor seja tolerável, o autor permite o apoio parcial do membro.
Se o edema for intenso, após as 72 horas, poderá efectuar-se banhos alternados de água quente e fria, podendo aplicar-se ultra sons locais. Na fase subaguda, o autor considera que se deve iniciar um programa de tonificação das massas musculares e o treino da proprioceptividade articular, tendo em atenção que o mecanismo em inversão não lesa apenas os ligamentos, mas há também rompimento de terminais sensitivos proprioceptivos que têm como função a informação do cérebro da posição espacial da articulação, e a inervação das massas musculares que estabilizam a articulação.
Normalmente, a prática desportiva é reiniciada 8 a 15 dias após o episódio, sendo que, segundo o autor, algumas vezes os atletas referem dor na região ântero-externa do maléolo peronial durante 2 a 4 semanas, e que normalmente desaparece mais rapidamente se o atleta inicia mobilização precoce.
Nas lesões instáveis, a opção pode ser, segundo o autor, conservadora ou cirurgica. Na primeira opção, Massada opta pela bota gessada com tacão por 4 semanas, com permissão de apoio precoce. A reabilitação funcional é iniciada precocemente, sendo permitido o treino de campo quando o atleta ganha a amplitude articular normal e não referir sinais de instabilidade funcional.
Quanto à opção cirurgica, o autor considera factores que poderão determiná-la:
• Teste da gaveta anterior positivo no rx de perfil, com desvio anterior do astrágalo em relação à mortalha tibioperonial igual ou superior a 10mm;
• Abertura da interlinha articular externa pela báscula do astrágalo na mortalha tibioperonial durante o rx de face com stress em inversão, igual ou superior a 10º, quando comparada com a articulação contralateral;
• Atleta de alta competição com idade inferior a 30 anos, com bom perfil psicológico, praticante de desporto que implique o salto ou uso de pitões;
• Lesão do tornozelo pertencente ao membro inferior biomecanicamente dominante. O autor realça, neste aspecto, que o membro dominante na maioria das modalidades desportivas é o contralateral ao membro superior dominado pela lateralidade cerebral.
Contudo, o autor não utiliza um critério implacável para o tratamento cirúrgico, considerando a idade, o perfil psicológico e as suas necessidades fundamentais como os factores primordiais para a opção cirurgica.
Crowther (2004), aconselha a mnemónica «RGCE»- repouso, gelo, compressão e elevação para o tratamento imediato, contudo ressalva que o repouso não significa imobilização que apenas deve ser efectuada, segundo o autor, em casos de fractura. Quanto ao gelo, o autor aconselha a aplicação do mesmo durante 10 a 20 minutos em cada uma ou duas horas, nas primeiras 24-48 horas de forma a aliviar o edema e a dor, sendo que outra forma de prevenir o agravamento do edema é elevar a tibiotársica acima do nível cardíaco nos primeiros dois dias. Ainda segundo o autor, o paciente deve ser motivado a iniciar carga quando diminuir o edema. Ele afirma, que embora se observem grandes melhorias nos sintomas, normalmente em 3 / 4 semanas, pode acontecer de apenas em 6/8 semanas a maioria dos sintomas estar resolvida.
A fisioterapia precoce, a redução da dor e do edema, e uma melhoria da força, são apropriados para as entorses de grau I e II, sendo controverso, como foi referido anteriormente, a opção para a reabilitação funcional ou cirúrgica. Na reabilitação funcional, tem-se por objectivo a recuperação funcional e o fortalecimento da tibiotársica, utilizando-se frequentemente, os movimentos activos, o treino (moderado) e os exercícios contra resistência. Voltar a fazer carga, auxilia na diminuíção da dor e do edema. Se o examinador, estiver preocupado com a lesão ligamentar, deve encaminhar o desportista para ortopedia nas primeiras 48/72 horas, sendo que no caso de dor óssea, deformidade óbvia da tibiotársica, compromisso neurovascular e instabilidade articular deve ser reencaminhado imediatamente, de forma a fazer os exames complementares necessários.
2.6 Treino proprioceptivo
Como referido anteriormente, na entorse há a lesão de mecanorreceptores, cutâneos, articulares e musculares, que têm um papel vital no sentido de posição e cinestésico.
Assim, o treino proprioceptivo tem como função, segundo o mesmo Saraiva(2006):
1 Melhoria da consciencialização do sentido posicional e cinestésico
2 Melhoria do equilíbrio
3 Melhoria do controlo neuromuscular
O autor refere que o treino do equilíbrio deve ser executado em planos instáveis e de forma progressiva:
Apoio bipodálico- Monopodálico
Ajuda dos membros superiores-sem ajuda
Olhos abertos-Olhos fechados
Deve ser executado em várias superfícies, visando o aumento das amplitudes articulares e fazendo uso de estímulos externos.
O autor, faz uma proposta terapêutica para atingir os objectivos do treino:
• Na mesma sessão executar os exercícios, primeiro de olhos abertos e depois de olhos fechados
• 1º trabalho em superfície estável, ex: estrela
• 2º tábua com instabilidade monodireccional
• 3º tábua com instabilidade multidireccional
• 4º trabalho de saltos
- salto único em apoio monopodálico
- salto com theraband
- salto com trampolim
2.7 Instabilidade crónica
Segundo Massada(2003), a instabilidade crónica por rotura dos suportes capsuloligamentares externos, é significativamente elevada, a que não será alheio a elevada taxa de frequência da entorse do tornozelo na prática desportiva, e por outro lado, pela forma desamiado funcional como é tratada.
Para o autor, é importante diferenciar uma instabilidade mecânica que poderá determinar ou não o surgimento de uma instabilidade clínica, de uma instabilidade funcional:
• A instabilidade funcional do tornozelo causa uma instabilidade clínica determinada pela perda da potência muscular e pela alteração da proproceptividade reflexa determinada pela massa muscular da região externa da articulação ( músculos curto e longo peronial lateral).
• A instabilidade mecânica do tornozelo poderá ou não condicionar uma instabilidade clínica, dependendo da perda dos suportes ligamentares da articulação do tornozelo.
• A instabilidade crónica limita seriamente a actividade desportiva, originando a longo prazo alterações degenerativas do tornozelo, pelas recidivas das entorses e pela alteração da concentração dos esforços mecânicos articulares.
O autor, previligia primariamente o tratamento de forma conservadora, visando o ganho de potência muscular e o treino da proprioceptividade, que foi abordado anteriormente.
Por outro lado, quantifica a instabilidade mecãnica do tornozelo, por exames radiológicos em stress, tratando cirurgicamente, no caso de ser sintomática.
Após a correcção cirurgica, o ortopedista imobiliza o membro com gesso por 4 semanas, permitindo a carga total com tacão apartir dos 15 dias de pós-operatório. Após o período de imobilização. O atleta inicia a ercuperação funcional, fazendo corrida apartir das 6 semanas e actividade desportiva entre a 8ª e a 10ª.
Conclusão:
Na verdade, a entorse da tibiotársica é uma lesão com elevada incidência nos futebolistas pelos gestos técnicos típicos desse desporto.
A entorse por inversão, é bastante superior à entorse cujo mecanismo de lesão é o de eversão, não sendo alheio a este facto a maior resistência a stresses do ligamento deltóide, quando em comparação com o ligamento lateral externo. Por outro lado, o facto de o maléolo lateral, também fornecer oposição à eversão excessiva, é um facto que aliada ao referido anteriormente, explica a frequência do mecanismo das entorses.
A classificação das entorses da tibiotársica em 3 níveis é praticamente unânime. Primeiro grau para estiramento ligamentar, segundo para rotura parcial e o último para rotura total. No entanto, Massada refere ser disfuncional a aplicação da mesma na prática e prefere classificá-las em entorses estáveis e instáveis.
No tratamento, é mais que conhecido o «RICE», repouso, gelo, contensão e elevação para as primeiras 48h. No entanto, é bastante importante uma avaliação atenta da articulação tendo em consideração, que com alguma frequência, com a entorse, estão associadas fracturas maleolares e luxações.
Com a lesão dos mecanorreceptores nas entorses, cuja função é a transmissão do sentido posicional e cinestésico, é vital o treino proprioceptivo, de forma progressiva, para o regresso à competição.
Não é de desprezar, o número de entorses recidivantes, bem pelo contrário, bem como o fenónemo de instabilidade crónica articular, pelo que os elementos envolvidos no fenómeno desportivo devem estar consciencializados para este facto.
Trabalho elaborado por Carlos Maia no âmbito da Pós Graduação de Reabilitação no Desporto
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Soares, J. (2005) . O Treino do futebolista: Resistência, força, velocidade.Porto,Porto Editora.
Soares, J. (2007) . O Treino do futebolista: Lesões, nutrição.Porto,Porto Editora.
2 comentários:
Excelente Post. Obrigado!
Meu problema é o pé direito, já extraí uma parte do tendão por estar necrosado,com isso perdi o movimento de agachar-me.fiz essa cirurgia e ressonância em 2008,de lá pra cá tenho tido muitas dificuldades em trabalhar,hoje às dores são piores...Resultado dá ressonância de 2008; derrame articular, tenossinovite do tibial posterior, lesão parcial crônica dos ligamentos tíbio fibular e talo fibular anterior,edema ósseo medular no tálus, alteração degenerativa incipiente na talo navicular anterior,meu ortopedista me classificou como inválida,mas INSS e peritos estaduais e federais não aceitam.Gostaria de uma posição definitiva,o que posso fazer?? Já que não consigo exercer minha função,por ser em pé... Obrigado pela atenção.
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